domingo, setembro 29, 2002





Coisa que tem aqui em São Paulo é pombo. É pombo que não acaba mais.
E ontem, voltando pro hotel, um amigo disse assim:
- Os pombos daqui nem estranham mais a gente. A gente passa do lado e eles nem ligam.
- É verdade - concordou outro - e ainda dão uns rasantes!!! A gente tem que se abaixar pra não dar uma cabeçada no pombo!
- E ainda fazem cocô na cabeça da gente! É um absurdo! Um abuso!!! - reclamei eu, indignadíssima.

Aí eles olharam para mim com aquela cara de "heim?" e eu tive que contar...
da vez que um pombo fez cocô na minha cabeça.

(da maravilhosa série: isso só acontece comigo)

Isso só acontece comigo...I

Estava eu na sétima série e tinha um paquerinha - coiso mais lindio desse mundo - que chamaremos aqui de Apolo.
O menino era lindo - loirinho dos cabelos cacheados, olhos verdes com risquinhos castanhos, alto e magro.
Ele já estava na oitava série - o que na minha escola correspondia ao grau máximo de status - mas mesmo assim falava comigo.

Conversávamos durante todo o recreio e todo dia voltávamos juntos pra casa.
Foi a primeira pessoa que me falou em depressão.
Com seus tristes olhos verdes:
"Estou me sentindo tão... deprimido".
E eu claro, fiquei de quatro, porque homem - pra mim - tem que ser complicado. É sina.
Comecei a usar roupa preta e batom - para impressionar. E parecer mais velha - claro.

Mas era só amizade...
Até que num belo dia a gente estava voltando pra casa e Apolo segurou a minha mão.
Fiquei gelada!
"ai, meu deus ele segurou a minha mão
ele segurou a minha mão
ele segurou a minha mão!!!!
o que eu faço
o que eu faço
o que eu faço?
Já sei, respira fundo, olha pra cima e sorri."

Aí eu respirei fundo, olhei pra cima, sorri e...
ploft!
um pombo fez cocô na minha cabeça.

pausa para a interpretação do psicanalista:

- Então, Amarílis, você acredita que este episódio traumático de sua pré-adolescência possa ter tido alguma influência na sua decisão de jogar uma bomba nuclear na antiga residência do Marquês de Pombal?

- Não... Esse caso da bomba tem mais a ver com aquela vez em que eu fiquei meia hora andando pela praia com o sempre-livre pendurado no biquini.
Mas aí já é outra história...

- ah... então prossigamos.
- Tá, como eu ia dizendo...

O pombo fez cocô na minha cabeça.
E eu ainda demorei uns quinze segundos sem entender direito o que tinha acontecido, só olhando aquela expressão de horror no rosto de Apolo.
- O que foi? O que foi?
Até que caiu um pedacinho no meu ombro.
- Aaaaaaaarrrrghhhhhhh!!!!!!!

E eu saí correndo em disparada na avenida. Os carros buzinando, freando em cima da hora:
- Sua doida!!!!!
E eu lá:
- Aaaarrrrrghhhhhh!!!!!!!!

Basta dizer que eu morava no 19o andar e fui de escada em 15 segundos, eu e meu grito ancestral evocando todas mulheres humilhadas desde a pré-História, quando o primeiro pombossauro fez cocô na cabeça da primeira Mulher de Neanderthal:
"aaaarrrgghhh!!!!"
(muito embora a Mulher de Neanderthal não tenha gritado nada porque o pombossauro era muito maior que os pombos atuais e seu cocô pesava uma tonelada)

Eu queria morrer.
Não queria mais ir pra escola.
Passava o recreio inteiro escondida no banheiro.
Queria mor-rer.

Aí no dia que o menino vem falar comigo, eu lá querendo enterrar minha cabeça num buraco, ele vem dizer que está... deprimido... aquela angústia... e o ser... o não ser... e o disco novo do REM.
Ah, peraí meu filho.
Eu paquero contigo, um pombo caga na minha cabeça na tua frente, eu encaro a morte me jogando na frente de vinte carros com o meu cocô de pombo na cabeça e
VOCÊ é que tem motivo para estar deprimido?

E é por isso que eu digo: se nessa eu não me matei, é porque eu não morro mais.
Ilis forever!
Mico forever!
Porque é de micos que se vive a vida.
E tenho dito.

sexta-feira, setembro 27, 2002

Back´n Black
Gente, muuuuito tempo sem postar, né?
Foi mal, mas vocês hão de entender (hão de entender - chique heim? Resultado das minhas aulas com o Pasquale!
Ah, aliás, uma coisa que há tempos eu queria postar. Sabe o que o Pasquale me ensinou? Que em português arcaico a gente dizia assim:
"Eu hei um amor"
! ! ! oh ! que coisa linda! ! !
E agora eu vivo a querer me apaixonar para assim poder dizer: eu hei um amor...)

...mas como ia dizendo: vocês hão de entender que meu tempo aqui está curtíssimo!!!
Muuuitas novidades mesmo!
Só pra dar um gostinho: nos últimos sete dias eu aprendi a fazer origami, tive um curso intensivo de direito, fui chamada para dançar tango, participei de uma coletiva com o Maluf e fui pedida em casamento no meio da rua.
É pouco ou quer mais?

Mas vou fazer suspense...
Hahahahahahhhh!!!! Claro, meu povo! Como é que vocês acham que o povo da Rede Globo ficou rico? Primeiro capítulo: moça conhece moço, engravida, perde a memória, recupera a memória, casam-se e ficam felizes para sempre?
No no no. Tem que ter o suspense.
Ah, mas enquanto isso, algumas coisas:

First of all...
- Vou escrever um livro. Já decidi.
Isso porque essa semana eu tive a melhor idéia de título de todos os tempos e não posso deixar passar.
Vai ser um clássico!
Sente o drama: você vai lá na estante e só vê assim, em letras góticas douradas:
"SEQÜESTROS EQÜESTRES..."
Não dá vontade de ler?
Eu leria! Agora só tenho que pensar no enredo...

By the way...
Eu também vou escrever outro livro.
Esse vai chamar:
"ÁGATA - A GATA"
Uma coisa assim meio mística, meio Paulo Coelho com La femme Nikita, que tal?
Ágata, a cigana de olhos verdes que sai em busca de seu verdadeiro eu no caminho de Santiago e termina como uma espiã russa conhecida como "A Gata".
Missão: impedir que a máfia mexicana destrua o mercado sobralense de milho cozido.
Pior inimiga: Adelaide - ô - uma anã paraguaia.

Aí ela se perde nos labirintos alucinantes da metrópole DownTown e quando está desesperada porque não encontra o caminho e a bomba vai explodir e detonar metade da Jamaica em menos de 10 segundos...
!!!
...será que aí eu posso usar o Mestre dos Magos ou tenho que pagar direitos autorais?
hmmm.... tenho que conversar com o meu agente.

Finally...
E agora pra pegar pesado uma poesia que eu recebi do meu amigo Tom.
(ei, tu - eu não sei o que dizer. mesmo.
muuuito obrigada.)


O Poema do Semelhante
(Elisa Lucinda)

o deus da parecença
que nos costura em igualdade
que nos papel-carboniza
em sentimento


que nos pluraliza
que nos banaliza
por baixo e por dentro,
foi esse deus que deu
destino aos meus versos,
foi ele quem arrancou deles
a roupa de indivíduo
e deu-lhes outra de indivíduo
ainda maior, embora mais justa.

me assusta e acalma
ser portadora de várias almas
de um só som comum eco
ser reverberante
espelho, semelhante
ser a boca
ser a dona da palavra sem dono
de tanto dono que ela tem.
esse deus sabe que a palavra "alguém" é apenas
o singular da palavra "multidão".



eh mundão:
todo mundo beija
todo mundo almeja
todo mundo deseja
todo mundo chora
alguns por dentro
alguns por fora
alguém sempre chega
alguém sempre demora.


o deus que cuida do
não-desperdício dos poetas
deu-me essa festa
de similitude



bateu-me no peito do meu amigo
encostou-me a ele
em atitude de verso beijo e umbigos,
extirpou de mim o exclusivo:
a solidão da bravura
a solidão do medo
a solidão da usura
a solidão da coragem
a solidão da bobagem
a solidão da virtude
a solidão da viagem
a solidão do erro
a solidão do sexo
a solidão do zelo
a solidão do nexo.


o deus soprador de carmas
deu de eu ser parecida



aparecida
santa
puta
criança
deu de me fazer
diferente
pra que eu provasse
de alegria
de ser igual a toda gente



esse deus deu coletivo
ao meu particular
sem eu nem reclamar
foi ele, o deus da par-
essência
o deus da essência par.



não fosse a inteligência
da semelhança
seria só meu o meu amor
seria só minha a minha dor
bobinha e sem bonança
seria sozinha a minha esperança


************
:)
Diferentes mas iguais



terça-feira, setembro 24, 2002

PARABÉNS!!!
Hoje é o aniversário da minha irmã, Érika.
Lindinha, muitas felicidades!!!! Você sabe que eu te amo muito muito muito muito!!!!!!!
Todas as coisas boas do mundo pra você.
:)



segunda-feira, setembro 23, 2002

Eba!

Mari, como o serviço de comentários do teu blog estava com problemas, vai por aqui mesmo:
PARABÉNS!!!!!!!!!!!

Eu sabia que você conseguiria! Estou tão feliz!!! Queria muito estar aí para te dar um grande abraço, mas... ah, que distância que nada! Amigas como nós sempre estarão perto uma da outra.
:)

Gente, pra quem não sabe, minha amiga Marina acabou de concluir a monografia dela sobre os Beatles.
Vão dar um abraço nela!!!
Ah, e já que eu não tenho o blogchalking, explico aqui mesmo: o "Verborragia" é minha "mãe" do mundo blogueiro.
Foi a Mari que me incentivou a fazer o Moshi Moshi, inclusive foi ela que sugeriu o nome.
Isso entre outras milhares de coisas que eu tenho para agradecer.
:)

Valeu, Mari!!!!
Pra você:

Ob-La-Di
Ob-La-Da


Desmond has a barrow in the market place
Molly is the singer in a band
Desmond says to Molly "girl I like your face"
And Molly says this as she takes him by the hand

Ob-la-di ob-la-da life goes on bra
La-la how the life goes on
Ob-la-di ob-la-da life goes on bra
La-la how the life goes on

Desmond takes a trolly to the jewellers stores
Buys a twenty carat golden ring
Takes it back to Molly waiting at the door
And when he gives it to her she begins to sing

Ob-la-di ob-la-da life goes on bra
La-la how the life goes on
Ob-la-di ob-la-da life goes on bra
La-la how the life goes on

In a couple of years they have built
A home sweet home
With a couple of kids running in the yard
Of Desmond and Molly Jones

Happy ever after in the market place
Desmond lets the children lend a hand
Molly stays at home and does her pretty face
And in the evening she's a singer with the band


Ob-la-di ob-la-da life goes on bra
La-la how the life goes on
Ob-la-di ob-la-da life goes on bra
La-la how the life goes on

sexta-feira, setembro 20, 2002

Queridos, desejo a todos um maravilhoso fim de semana. Da minha parte, vou passar sábado e domingo com minha mãe passeando nesta paulicéia. Amanhã já sei o meu programa: quero ir à Liberdade comprar um presente pra minha prima, algumas coisinhas pra mim e comer sushi.
Vou aproveitar para relaxar que esta semana foi pedreira demais!
Então segunda eu volto e conto as novidades procês.
Um beijo na ponta do nariz de cada um.
:)

Agora, a letra de uma música que eu ADORO e que tem no CD que eu comprei por apenas QUATRO REAIS E NOVENTA CENTAVOS!!!!!!! (eu e o meu dom das fadinhas!!!)

A Whiter Shade of Pale

We skipped the light Fandango
Turned cartwheels 'cross the floor
I was feeling kind of seasick
But the crowd called out for more
The room was humming harder
As the ceiling flew away
When we called out for another drink
The waiter brought a tray

And so it was that later
As the Miller told his tale
That her face, at first just ghostly
Turned a whiter shade of pale

She said there is no reason
And the truth is plain to see
But I wandered through my playing cards
And would not let her be
One of sixteen vestal virgins
Who were leaving for the coast
And although my eyes were open
They might just as well've been closed

And so it was that later
As the Miller told his tale
That her face, at first just ghostly
Turned a whiter shade of pale

And so it was....
:-)
Ontem, correndo atrasada pro jornal, eu vi um velhinho com um papagaio no ombro.
Depois, fui a uma palestra do Niemeyer.
À tarde, vi um show do Toquinho.
À noite, vi o Coringão dar de dois a zero do Vitória no Pacaembu - iuuhuuuu!!!!!!!!
Um dia bom.
Mas tãaaooo bom...
Tô feliz.

quarta-feira, setembro 18, 2002

*O HOTEL*

E como não basta ser pobre, tem que ser metida a besta, lá estou eu no meu quarto chiquérrimo no Othon achando motivo pra reclamar da vida.
Fui no quarto do Henri, fui conhecer o do Ricardo e voltei cheia de exigências:
- Ah, mas o meu nem tem salinha... Nem vista pro Teatro Municipal... Quero mudar.

E depois de muito aperrear a coitada da moça da recepção, consigo enfim mudar para um quarto melhor.
Vista pro municipal.
Com salinha pra receber as visitas.
Guarda-roupa de quatro portas.
E um espelho maravilhoso pra gente se ver de corpo inteiro e que ainda e-ma-gre-ce!!!!!!!
Ooooohhhhhhhhh!!!!!!!!!!!!!!

É este mesmo.
"Mas senhora Amarílis - eles chamam a gente assim, de senhor e de senhora, um barato! - tem um probleminha: em vez de uma cama de casal, este quarto tem duas camas de solteiro".
E isso é problema?
A gente junta as camas, não seja por isso.
"É esse mesmo".
E com um sorriso de uma orelha à outra, peguei a chavinha do 1603.

Dá um semana, eu estou lá, feliz e refestalada sobre minhas duas camas de solteiro, com meu próprio roupão amarelo bordado "Othon Palace Hotel", comendo biscoito e assistindo TV à cabo bem dizer na vida que pedi a Deus...
toca o telefone.
- Alô?
- Senhora Amarílis?
- Oi.
- Senhora Amarílis, eu estou ligando para perguntar se a senhora já sabe que vai ter que mudar de quarto.
- O que?

O que pensar? Puta que pariu... O jornal só pagou quartos mais baratos e eu não tenho o direito de ficar nesse chiquérrimo.
Sabia.
Alegria de pobre dura pouco...

- Por que? - perguntei, toda desolada.
E a moça explicou que ia chegar um grupo muito grande no hotel para uma feira de cosméticos e eles iam precisar dos quartos com duas camas. Por este motivo, pediam que eu fosse para um quarto com cama de casal.
- Bem, disse eu, é que eu esperei tanto para vir pra esse aqui, que... tá, vamos fazer o seguinte: vc procura aí quais os quartos que estão livres e, se eu gostar, eu mudo.

Dá cinco minutinhos, ela liga de novo.
- Senhora Amarílis, encontrei um quarto no 22o. andar. A senhora gostaria de ir vê-lo?
Fui.

- Oooooooooohhhhhhhhh!!!!!!
- Oooooooooohhhhhhhhh!!!!!!
- OOOOOHHHHHHHHHH!!!!


Close no meu queixo caído.
- Não acredito!!!!!!

Gi-gan-tes-co.
A sala imeeeensa.
O banheiro imeeenso.
O guarda-roupa imeeenso.
A cama imeeeeeeeeeeeensa.
O espelho que emagrece e...
o que mais?
o que mais?
Uma poltroninha!!!!!!!

Corri pra janela.
Oooooooohhhhhhh!!!!!
São Paulo inteira ali, luzinhas piscando até onde a vista alcança. O Teatro Municipal feito uma jóia brilhando lá embaixo.
- Meu Deus, acho que dá até pra dar estrelinhas aqui!
E testei.
Dei duas estrelinhas, pra vcs terem idéia do tamanho.

- Pois se é para o bem do povo e felicidade geral da nação, diga ao povo que fico!

Na mesma noite mudei de quarto. Eu e minhas tralhas penduradas nas sacolas.
Meu golfinho Thumb embaixo de um braço, a boneca Débinha embaixo do outro.
E ainda ganhei chocolates porque tinha feito um favor pro Othon!!!

Ai, como a vida pode ser boa!!!!!!!!!!!

***
O que nos leva ao verdadeiro motivo de eu ter contado essas mudanças todas:

*O MOTEL*

Aí a minha mãe, a digníssima e distinda senhora Aparecida, liga pro hotel:
- Por favor, poderia transferir a ligação para o quarto 1603?
Momentinho Pour Elise
Lá-lá-lá-lá-lá-lári-lá
Lári-lá...
Lári-lá...
Um rapaz atende, com a voz grossa:
- Alô?

(Minha mãe estranha: que rapaz é esse????
Bem, deve ser um amigo da Amarílis...)

- Eu gostaria de falar com a Amarílis.
O rapaz dá uma risadinha safada:
- Agora ela está ocupada... hehehe... acho que não pode atender.
- Como assim? - pergunta dona Aparecida.
- Quem quer falar com ela?
- É a mãe dela!!!!!!
- Ops!!! A mãe dela?.......er... bem, a senhora aguarda um momentinho, por favor... eu vou chamar..... ei, acho que é a sua mãe...

A moça atende:
- Mãe?
- Amarílis? Quem é que está nesse quarto com você? Quem atendeu o telefone?
- Mãe?
- Amarílis?
- Heim?
? ? ? ? ? ? ? ? ?
- Quem está falando não é a Amarílis?
- Não...
- E qual o seu nome?
- Marisa.

Hahahhhh!!!!!!! Como se nunca tivessem confundido meu nome antes!!! E a história continua:

- Aí não é o 1603?
- É.
- E cadê a minha filha?
- Eu não sei...
- Quando você foi pra esse quarto?
- Eu vim pra cá hoje de manhã. Vou participar de uma feira de cosméticos. A sua filha também veio pra feira?
- Não... Ela é jornalista...
- Ah, e ela estava aqui?
- Estava.
- Então deve ter mudado de quarto... eu acho...
- É, vou ligar de novo pra recepção. E desculpe aí... bem... é... ter atrapalhado qualquer coisa...

Cara, a mamãe me contando essa história eu faltava morrer de tanto que ria.
Eu amo a minha mãe.
Ela é massa demais.

terça-feira, setembro 17, 2002

Ai que saudades de correr na Beira-Mar!!!!!!!!!!!!!!!!!!
:)
Beijos a todos, amanhã vou escrever um montão!!!!!!!
Na mosca!



Que coisa tosca você é?


Você não pode ver um solzinho que já quer levar toda

a cambada na Kombi para o Boqueirão. Nunca esquece de levar o frango com farofa, a bóia de pneu e o óculos escuros comprados no camelô. Chegando lá se joga na água de depois vai rolar na areia brincando de croquete. Na hora de ir embora fica se equilibrando para não cair enquanto tenta tirar o calção sem tirar a bermuda.

sábado, setembro 14, 2002

Wunderbar!!!

Caí.
Ai meu Deus que vergonha, de quatro na frente de todo mundo...Que queda ridícula... Meu joelho está doendo pra caramba...
Quem mandou eu querer dar o passo maior do que as pernas?
Mas calma que eu já estou novamente me adiantando aos fatos.
Foi assim:

Quarta feira tinha corcerto de graça na Júlio Prestes, uma estação ferroviária adaptada para espetáculos musicais.
Correndo correndo - "corre estamos atrasados!" - os meninos subindo os degraus de dois em dois e eu "se eles podem eu também posso" - sem atentar para o fato de que eles são apenas 20cm mais altos do que eu - lá vou pulando os degraus.
"Olha como o teto daqui é bonito..." fui olhar pra cima, me distraí e pá - de quatro no chão.
Mas pense numa queda!!!!

Depois de morrer de vergonha e rir - sim, porque o que nos resta nessa hora é rir (ou explicar pra platéia que na verdade somos artistas e isso foi uma super perfomance) - sacudi a poeira dos joelhos e, ainda mancando, fui com os meninos procurar nossas cadeirinhas. Localização inusitada: bem atrás do palco, vendo as costas dos músicos e de frente pra platéia - puro burburinho.

À nossa direita uma das moças que ficam dizendo: "seu bilhete, obrigada, boa noite"
briga com um menino de blusa rosa que queria passar pras cadeirinhas pulando a divisória do camarote.
Mas antes que eu ouvisse os detalhes da discussão a luz diminuiu - ou aumentou? não sei dizer - e o primeiro violino zumbiu suavemente.
Outros violinos zumbiram em resposta. Afinados?
Afinadíssimos.
Pois que entre o maestro!

Heitor Villa-Lobos
Prelúdio Bachianas Brasileiras n. 4


Desgrenhado como todo maestro que se preze deve ser - motivo pelo qual o Ricardo já avisou que vai ministrar um curso chamado "Como pentear maestros e cientistas" - Moshe Atzmon ergue sua batuta e...
...e aí que não era uma batuta coisa nenhuma.
Era uma varinha mágica, disso sei bem.
Com dois movimentos ele faz surgir algumas flores. Ali alguns passarinhos que - olha! - voam em direção ao teto. E um gigante que vem caminhando sobre o palco no ritmo do tambor. Magia pura.

E eu vou lembrando de uma vez... Lá se vão quase dez anos... Nossa, como eu estou velha!
;-P
Bem, na época eu vivia pra cima e pra baixo em cima da minha bicicleta, gostava de "Perigosas Peruas" e estudava piano no Conservatório de Música de Teresina.

Era fim de ano e as aulas seriam encerradas com uma grande apresentação. Meus irmãos há meses estudavam suas partituras. Eu não.
Eu não ia participar.

Não importava o quanto eu gostasse, as teclas do piano sempre fugiam de meus dedos e as semicolcheias corriam sobre a partitura numa velocidade muito maior do que a minha em dizer seus nomes:
Mi....dó...si...ai, si sustenido....mi...sol...
A professora já parecia ter desistido.
Uma careta a cada nota errada.
Um silêncio reprovador.
Mi... dó... si sustenido...
Não havia dúvidas: eu não havia nascido para aquilo.

Mas a uma semana da apresentação ela veio me dizer:
"Esta é a que você vai tocar".
"Eu? Onde?"
"Ora onde! Na apresentação."
"Mas... eu?... a apresentação é daqui uma semana. Eu não sei... eu não posso..."
"Você vai."

Treinei como uma doida. Saía do colégio direto pro conservatório. As notinhas correndo de mim, os dedos tropeçando uns nos outros. A mão esquerda sempre rebelde. E eu treinando treinando treinando.
Tanto que só no dia mesmo eu fui me tocar de que não tinha roupa.
De jeans, tênis e camisetas meu armário estava cheio.
Mas roupa chique?

"Não seja por isso", disse minha mãe, colocando sobre mim algumas roupas dela. Saia de veludo azul. Blusa florida de seda. Sapato branco com detalhe dourado.
Tudo um pouco grande mas aperta aqui, acocha ali, coloca um broche acolá e voilá - estava pronta.
E petrificada.

Passei o caminho batendo os dedos sobre os joelhos, irritada com meus irmãos que insistiam em fazer algazarra no banco de trás. Qualquer barulhinho, temia eu, e toda a melodia que havia demorado tanto para decorar fugiria de minha cabeça.
E como eu temia... fugiu.

Tranquei-me no banheiro do Auditório. Tentava desesperadamente encontrar as notas certas sobre a bancada da pia mas quando vi que elas realmente não viriam sentei no chão e chorei.
Chorei chorei chorei até que o show começou.
E chamaram meu nome.

Subi as escadinhas do palco tremendo mais que vara verde.
O rosto vermelho.
A saia de veludo azul.
O banquinho de madeira.
Ebony and ivory.
Fechei os olhos e...
aconteceu.

A música já estava ali. Eu apenas precisei fechar os olhos. E quando os abri, Moshe Atzmon recolhia com dois golpes enérgicos a magia de sua varinha e a platéia vinha a baixo: "bravo! bravo!".

Antonin Dvorak
Concerto para Violoncelo e Orquestra em si menor opus 104


A música recomeça.
Só então reparo que a poucos metros de distância está o menino da blusa rosa.
Tão absorto que mal respira.
A mochila surrada jogada a seus pés, as mãos cruzadas, os cabelos cacheados caindo em desalinho sobre a testa. E ele mal respira. Juro, ele mal respira.
Durante todo o espetáculo não mexeu os pés.
Não sacudiu as mãos.
Não ajeitou os cachos.
Completamente hipnotizado pelas coisas que Dvorak lhe dizia, ainda que entre eles houvesse quase um século de diferença.
Entre todos os presentes, não havia ninguém - não havia - mais compenetrado do que ele.
Justamente o menino irrequieto que pulou a divisória do camarote e gesticulava tanto diante da moça que brigava com ele.
Agora ali. Estático.
E eu fiquei esperando: esse menino não vai se mexer? Não vai mesmo?
Esperei esperei esperei.
Então ele desentralaçou os dedos.
Levantou-se da cadeira.
Aplaudiu e foi embora, em silêncio.
Fim do primeiro ato.

Fábio Martins
Reggae do pobre


Volta ao mundo real:
- descendo as escadas com suas pernas incrivelmente compridas, Ricardo chuta a bunda de uma senhora.
- e o que a gente pensava que era boca livre transforma-se numa cruel cifra de DEZ REAIS a taça de champagne. Tá maluco?

Peter Tchaikovski
Sinfonia n.5 opus 64


De volta à cadeirinha, tenho mais uma vez diante de mim o maestro desgrenhado.
Ele saca a varinha.
Leva-a suavemente para a esquerda.
Os arcos dos violinos o acompanham dóceis.
Leva-a suavemente para a direita e desta vez são os arcos dos violoncelos que sobem, graves.
Da esquerda para a direita, da direita para a esquerda, vai se formando uma onda.
A orquestra sobe e desce como a maré.
A gente toca o pé. Toca a mão. Depois mergulha, sem pensar na profundidade.

Mas a música levanta-se, som de água contra as pedras.
Recua. Volta mais forte.
Vai e vem. Vai e vem. Cheia.
Extravasa o palco e chega às cadeiras, aos camarotes.
Inunda os corredores, desce pelas escadas, preenchendo todas as frestas.
Uma música que assusta. Som de tempestade. Vento uivando. Correnteza escura levando tudo o que encontra pelo caminho: memórias, sentimentos, medos.
O tambor troveja.
Os violinos ventam violentamente.

Mas veloz como veio, a tempestade vai. Subitamente, acaba.
Pois já cumpriu sua função: a terra está encharcada.
E dela brotamos: mais brilhantes, mais vivos, mais felizes.

E meus joelhos nem doem mais.
A beleza pode curar a dor.

sexta-feira, setembro 13, 2002

"Meu Deus, que casa linda!", era impossível não se surpreender com a imponência e elegância das casas ao longo do caminho. Ruas sinuosas, arborizadas.
Juro, não parecia São Paulo.
Não a São Paulo cinza e concreta que eu estou me acostumando a ver.
Uma São Paulo linda. Linda. Linda.
Aí o ônibus virou a esquina e nós descemos em uma das maiores favelas de São Paulo.

Uma das maiores favelas de São Paulo.

Ele manda.
Com seus inseparáveis cordões de ouro e seguranças, ele esteve ali ontem. Para mandar e desmandar. Passou algum tempo resolvendo seus negócios. Depois foi embora. Com seu ouro e seus capangas.
Mas sua presença ainda paira.
A gente pode sentir. Feito poeira depois de bomba, ele paira.

Mesmo dentro do projeto que é bonito e de medicina de ponta com propostas educacionais e paredes coloridas erguidas por voluntários.
Mesmo ali ele paira.
Ele esteve ali ontem. Resolvendo seus negócios. Falou que queria que o projeto abrisse a quadra de esportes no domingo.
Lazer pro pessoal, ele diz. Pago segurança, o que for.

E agora meu Deus, o que ela diz? Como que ela vai aceitar traficante pagando a segurança do projeto educacional?
Como que ela poderia aceitar isso?
E como ela poderia dizer que não?
Você vai dizer não?
Bem ali, no meio, eu quero ver você dizer que não.

Quer abrir uma pizzaria? Tem que pedir autorização.
Ele diz: você me repassa tantos por cento.
Você vai dizer que não?

Quer colocar faixa de político na rua? Tem que pedir autorização.
Tira, ele diz.
Você vai dizer que não?

E entre os milhares de casebres imundos miséria saltanto entre as folhas de madeira erguidos sobre o lixo que vem lá de cima dos prédios chiques cuja visão está entrecortada por dezenas de fios negros amarrados em postes para roubar energia do vizinho mas muitos, muitos fios negros mesmo você tem vontade de gritar bem alto:
NÃÃÃOOOO.
Mas antes que o som ganhe a garganta tem que pular pro lado pra não ser atropelado pelo Xsara Break preto que passa - último tipo - último volume. O gatinho ao volante buzina, óculos escuros, pura malandragem e desce possante a ladeira da favela onde está estacionado um Mazda vermelho.

Em uma das paredes, a placa: Asseita-se moças.
O cachorro late.
A menina passa, cabeça cheia de trancinhas.
E quem mora no Grotão o sonho é conseguir morar no centro da favela. O sonho é esse. Mas é difícil. Um barraco lá no alto tá custando quinze mil.

Quinze mil?
Pois é, ela confirma. Mas tem que ir. Os problemas são muitos e tudo o mais é muito pouco.
Então pegamos os ônibus e virando à esquina estávamos de volta às ruas arborizadas das casas lindas.
Das casas lindas onde mora o homem de cordão de ouro e capanga a tiracolo.
E a beleza também pode ser dolorida.

segunda-feira, setembro 09, 2002

Porque o começo foi assim, bem filme noir.
Eu e mamãe descemos na Estação São Bento. As malas já estavam no hotel.
Subindo as escadas do metrô, vimos o mosteiro de São Bento. Onze horas da noite. O frio atravessando a alma. A praça em frente. Vazia. E seria bonito. Sim, seria muito bonito e eu poderia ficar ali, olhando o mosteiro entre aqueles prédios altíssimos e a praça vazia, mesmo com o frio atravessando a alma eu ficaria horas ali olhando...
olhando...
olhando e ouvindo o silêncio.
Se não aqui não fosse onde é.

Então entramos apressadamente numa rua escura e caminhamos sem olhar pra trás, a bolsa apertada sob o braço, o eco de nossos passos toc toc toc nas paredes cinzas dos prédios altíssimos e nos rodapés dos prédios altíssimos umas manchas escuras que às vezes se mexiam e resmungavam para as visitantes inoportunas.
"Não tenha medo", disse minha mãe.
Mas eu tive porque do outro lado da rua vinha um grupo de meninos com agasalhos de capuz e eu não sabia se era pior dobrar à direita ou dobrar à esquerda ou seguir em linha reta então seguimos em linha reta e os meninos passaram, de cabeça baixa. Nós também passamos, de cabeça baixa. Eu olhando pros meus pés que faziam toc toc toc nos paralelepípedos negros desta rua que é umas das mais antigas da cidade até que o chão ficou claro. Pedrinhas brancas da Praça do Patriarca e um foco de luz forte no alto de uma construção.
Do gelo da rua passamos ao calor do hotel. Um porteiro negro e forte sorriu, com seu uniforme vermelho. A moça da portaria sorriu, entregando a chave.
E lá tudo era quente e bonito e aconchegante.
E lá eu poderia até esquecer os passos recém-dados na rua escura se aqui não fosse onde é e mamãe não tivesse que voltar pela rua escura para pegar o metrô e ir à rodoviária pegar o ônibus que a levaria de volta a Campinas. Não houve pedido que a demovesse.
Com a filha segura, dentro do hotel elegante, abraçou-me e saiu, para o frio da rua.

E assim eu senti como é viver nessa cidade.
Dentro do hotel, dentro de casa, dentro do carro, dentro do shopping, do lado bonito do muro, sob o travesseiro quentinho onde repousamos nossa cabeça - a inquietação porque, do outro lado, está alguém que amamos.

Depois o telefone tocou e minha mãe disse que estava bem.
Já em seu hotel, onde também é bonito e aconchegante e seguro.
E em Teresina meus irmãos e meu pai disseram alô e contaram que também estavam bem.
E eu, enfim, poderia dormir.

Mas e esta inquietação sob o travesseiro?

************************************
Minha mãe sempre disse, com muita propriedade, que à noite tudo parece mais difícil.
É verdade.
Na manhã seguinte a cidade me recebeu mais cordialmente.
Não amiga, ainda.
Não carinhosa.
Indiferente.
Mas porque seu jeito de ser é assim mesmo, com todos. Mesmo com seus filhos.
Em todo caso, não me franziu o senho, o que já é um bom sinal.

Saudou-me com uma lufada de vento frio no rosto que nada me fez, além de deixar as bochechas vermelhas.
E eu vi que os prédios altíssimos do centro antigo eram belos, com seus rococós de arte nouveau.
Não mais tão noir.
Na verdade cores, muitas cores.

Não mais as ruas silentes.
Na verdade, muito barulho. De despertadores tocando, sirenes agudas, brinquedos paraguaios movidos a pilha, pessoas rindo, pastores gritando, músicas e buzinas.

E é bonito.
Mesmo sendo onde é.
Apesar de ser onde é.
Justamente por ser onde é.

****************************************
Chego ao Viaduto do Chá e misturo-me a executivos que passam de terno e gravata secretárias de meia calça escura com sapatos de salto alto evangélicas que não cortam o cabelo ciganas eu trago o seu amor um homem que finge estar possuído placas COMPRO OURO que os velhinhos vestem sim os velhinhos vestem as placas e a multidão se junta ao redor deles para ler COMPRO OURO VENDO CELULAR PROPOSTAS DE EMPREGO tanta gente desempregada jovens ladrões que passam correndo com o furto nas mãos um ainda pede licença a arquitetura sob as pichachões bijuterias casacos em promoção liquidação 50% off a japonesa que vem na esquina ainda louca e esbarra em nós sem mesmo assim nos ver os olhos perdidos o batom manchada a flor artifical no pescoço e atravessa a rua completamente louca olhando pro céu.

**************************************
Meus olhos cheios. Minha mente cheia.
Dia após dia.
Cheia também de letras e manchetes com aquilo que não pude ver.
Ofensiva de Bush pela guerra FGTS será usado na compra meninas são agredidas avião cai em avenida e mata Garotinho defende legalização de jogos Márcia Pinheiro, decoradora Romário parte pra briga
Horário de fechamento cinco quatro três dois um...

******************************************
Vou ao estádio.
Palmeiras e Coritiba dois a dois no Parque Antarctica eu nunca vi algo como a torcida verde pulsando na arquibancada um ser com vida própria a gritar todos os impropérios e o fiscal da federação com mais de 80 anos cochicha no meu ouvido eu sou corinthiano sorrio e cochicho de volta eu também ele me diz que vai voltar de carona pra casa a não sei quantos quilômetros de distância e amanhã sai com o dia ainda escuro para estar às oito do outro lado da cidade e me oferece o casaco você não está com frio?
Volto.
De táxi cruzando as avenidas do centro em busca do disco voador de onde desceram todas aquelas criaturas tão extraordinárias que só saem à noite de saia curta brilhante e cabelo comprido o rapaz todo de branco e gravata espalhafatosa e cordões de ouro que cintilam mesmo de longe e fala ao celular com gestos largos diante do clube o neon piscando rosa e azul o taxista reclama tudo bicha dois bigodudos se beijando tem um nego bichinha que só veste de rosa e ri alto de suas próprias piadas enquanto os meninos vendem drogas no cruzamento.

*****************************************
Mercado Mundo Mix
Tecno Tecno Tecno tumtistumtistum sobrancelhas rosas malabares de fogo cabelo cor de rosa aquela é a clarah averbuck? eu acho que é bolsas de discos de vinil tatuagens meias listradas até a coxa uma bonequinha toda espetada por alfinetes na Voodoo e quando você acha que todos os lugares passíveis de piercing já foram explorados encontra motivos para se surpreender mas uma surpresa boa porque eu gosto lá tem panos brilhantes e colares pontiagudos óculos imensos pra ver o mundo feito um arco-íris e tum-tis-tum mas é tudo caro é caro ser alternativo hoje em dia ainda assim compro um casaco que dá pra usar dos dois lados eu preciso de um casaco porque aqui está um frio miserável e quando a gente sai uns pinguinhos de chuva no rosto corremos pro metrô.

*******************************************
Então chego ao hotel.
Ligo as torneiras. A banheira enche devagar.
Eu mergulho devagar na água morna.
Eu lavo os cabelos devagar.
A banheira cheia. Minha mente vazia.

E fico ali até os dedos engilharem, olhando pro teto.
Olhando e ouvindo o silêncio.

*********************************************
E é bom.
Mesmo sendo o que é.
Apesar de ser o que é.
Jus.ta.men.te por ser
o que é.

terça-feira, setembro 03, 2002

oi...
- Oi, você está indo para São Paulo?
Olho pro lado, era uma moça de trinta e poucos anos, baixinha e sorridente.
- Vou sim. Por que?
Ela estava assustadíssima. Primeira vez em Sampa, não conhecia nada nem ninguém. Ia fazer uma prova. Com o atraso do vôo, tinha medo de andar por aí tarde da noite procurando hotel. Estava disposta a passar a noite no aeroporto.
- Ah, que é isso... você fica comigo e com a minha mãe. A gente já tem hotel. Tem tudo.
Ela aceitou.
No dia seguinte fomos as três procurar o local onde ela faria a prova, na Lapa. Depois fomos à Liberdade. Depois fomos não sei onde...
Só sei que no fim do dia ela e mamãe já estavam amiguíssimas. E conversando sobre hotéis e tal, ela nos contou esta história, que tenho o prazer de dividir com vocês:

"Viajei para um congresso em Recife. Cheguei com a mala e a coragem, assim como aqui. Não conhecia nada. Perto da rodoviária, vi a placa de um hotel. 'Oba, é aqui mesmo!', pensei.
Cheguei à recepção, pedi para ver o quarto.
Quando a moça que trabalhava lá abriu a porta, eu estranhei. Diabéisso?
Uma cama enorme, ao lado de um espelho que cobria a parede toda.
Nem guarda-roupa nem cômoda nem nada.
Na porta: uma janelinha.
Eu nunca vi janelinha na porta!!!
Comecei a estranhar...
Já instalada, deitada na cama ao lado do super espelho, senti calor e percebi que lá também não tinha janela.
Como é que pode um quarto sem janela? Tem alguma coisa estranha aqui...
Abri a porta e vi uma senhora bem velhinha fazendo faxina:
- A senhora podia me dar uma informação?
- Pois não.
- Eu queria saber... assim... por que tem essa janelinha na porta? Por que não tem janela de verdade?
- Bem... a senhora jura que não conta pra ninguém que eu disse?
- Juro.
- Isso aqui é um motel."


- E você não tinha percebido?!!!!!!!
- Não!!!!!!!
Mamãe faltava passar mal de tanto rir. Já combinaram de sair juntas quando mamãe for a Fortaleza. Trocaram telefones. Sintonia imediata.
No dia seguinte ela foi fazer a prova dela na Lapa.
Eu e mamãe viajamos para Holambra, ver uma feira de flores.

Desejamos boa sorte, felicidades e seguimos nosso caminho.
E eu não sei se nessas curvas da vida a gente se encontra de novo. Quem sabe?
Mas já valeu.
Só pela história do motel, já valeu...
no estacionamento...
A mala do tamanho do mundo. Sério, ninguém faz idéia do tamanho da minha mala.
Gigantesca.
Eu e a Dani no maior esforço para tirar do bagageiro do carro. Puxa daqui, puxa dali. Nada.
Chega um senhor desses que ajudam a carregar as coisas.
- Vocês querem ajuda?
- Ah, se o senhor puder dar uma mãozinha aqui pra gente...
- É claro que eu só posso dar uma mãozinha! Eu sou aleijado!!!!!
Quando eu olho, a mão esquerda do homem bem miudinha.

Ai caramba...

E ele puxa a mala daqui. Puxa dali. Nada.
- Bem... eh... o senhor... a gente pode ajudar o senhor?
- Não. Eu consigo.
- Mas... moço... tá um pouco pesada.
- Eu consigo.

Ai caramba...

no check-in...
- Mas minha filha, o que é que tem aqui dentro? Um corpo?
Pois é.
A gente paga 35 reais de excesso de bagagem e ainda tem que passar por esse tipo de humilhação.
E lá vai a minha filhotinha entalando na esteira.
O moço empurra.
Ela vai um pouquinho na esteira... entala de novo.
ai ai ai...

no restaurante...
Dani, Cacau, Mari, Mon, Dê e Débi. Minhas amigas lindas. E se eu disser que ganhei um ramalhete de lingüiças para sempre me lembrar deste momento "amigas" vocês acham bizarro?
Mas foi lindo.
Dê, teu ikebana de lingüiça é tudo.
=D

no painel...
Vôo da Fly para São Paulo
Atrasado pra São Paulo
Em vez de sair às 14h
Sai às 16h...
ai caramba...

na livraria...
Uma surpresa maravilhosa.
Encontrei o livro "Paisagens Particulares", que - de tão lindo - quase me fez perder o horário do vôo...

no vôo...
- Oi, você vai para São Paulo?
e assim começa um novo capítulo...
Tantas coisas, por onde começar?
Primeiro, tá um frio do caramba!!! Mas antes...
Tá, bem antes...
(agora você imagina aquela fumacinha ao redor da tela que indica o momento flashback)
Quinta passada. Véspera de viagem.
Eu toda chorona...
Aí Ximena e Janecleide vão lá pra casa. Isso ia prestar? Ia não...

A Ximena chega e pergunta logo assim:
- Tem cerveja?
Isso é coisa que se pergunte numa residência onde só moram duas moças puras e meigas e recatadas?
Respondo:
- Tem.
O que ela diz?
- Então vamos comprar mais.

Fomos ao Pão de Açúcar, comprar bebidas e pizza congelada.
Enquanto a pizza esquentava no forno e as cervejinhas iam sendo consumidas, eu tentava conduzir a conversa, dando a ela aquele saudável tom deprimido e desconsolado:
- Porque amigo, cara... Amigo a gente não encontra assim, em toda esquina. Amigo é coisa importante, cara... Nossa...
- Não chora, Ilis, não chora...
- Mas... eu vou sentir... cara, eu vou sentir tanta saudade... de...vo...Buáááá´...

Então Ximena, que é uma mulher de atitude, tomou uma atitude. Débi já havia chegado em casa e ela veio com a seguinte proposta:
- Ei, o que vocês acham da gente fazer a lista dos caras hollywoodianos que a gente mais gostaria de levar pra cama?
Mais uma vez: isso é coisa que se perguntar num ambiente familiar?
Respondemos:
- Massa!!!

Papel e caneta. Nomes óbvios, como vocês podem imaginar: Brad Pitt, Pierce Brosnam, Jared Leto...
Ah, e um Harrison Ford que eu não sei porque a Débi tem essa obsessão com esse homem.

Fim da brincadeira? Uma olha pra cara da outra, Ximena sugere de novo:
- Agora os homens famosos mais feios que mesmo sendo muuuuito feios a gente topava.
Nossa, cada lista era melhor que a outra! Quase apanhei quando disse que o Lenny Kravitz é feio, mas eu topava. Ximena subiu nas tamancas:
- Ele é lindo!!!!!!
- Ximena, ele é estiloso, charmoso, interessante... tudo. Mas é feio.
- É lindo!!!!!!

Ou seja: a beleza está mesmo nos olhos de quem a vê.
O que faz com que São Paulo - a cidade cinza de granito e poluição - pareça belíssima aos meus olhos estrangeiros.

Ah, mas agora eu quero a lista de vocês. Os cinco mais feios (ou feias) que, na verdade, são maravilhosamente lindos.
Um dois três... já: